12/04/2012

Nostalgia do sólido

Há dias a TVI fez uma reportagem de telejornal sobre o aumento do preço dos manuais escolares. Como resolveu ilustrá-la? Com uma entrevista a uma professora de escola primária do Estado Novo e imagens das capas dos manuais da época - sim, esses que entraram no mercado livreiro da saudade. Judite de Sousa pontuava isto tudo com sorrisos carinhosos e saudosos: a uniformidade dos livros ao longo de anos, os conteúdos dos mesmos, incluindo, claro, as colónias, e por aí fora. Ponto final. Nada de entrevistar quem proponha alternativas, positivas e democratizadoras, à atual política desastrosa de manuais escolares. Não: a alternativa é o passado - e que passado. Não confundamos, porém: isto não é um caso de filo-salazarismo, do tipo que aconteceu com a escolha de Salazar como figura histórica mais importante (também num programa de TV...), do tipo da escolha do nome do ditador para um vinho da sua região de origem, ou mesmo do tipo do que se ouve em autocarros e mercearias ("no tempo do salazar não avia nada disto"). Não é exatamente o mesmo. Ou não deveria ser. Isto é feito por pessoas, digamos, "diferenciadas", e com responsabilidades muito especiais que advêm do enorme poder de dominar os media. A questão é que são estas as pessoas que mais que vivem aflitas com a sensação de ausência de peso, de espessura, de densidade, de solidez, ou de gravidade, das suas vidas "pós-modernas" rendidas ao neoliberalismo (que não é "mera" economia", é também cultura, logo, "sensibilidade"). Se tudo o que é sólido se desfaz no ar - e na ausência de princípios e imaginação - o lugar da saudade é ocupado pelo autoritarismo, porque esse é o nosso passado. Tristeza.

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